Kamila Czepula

"FAÇA-SE O QUE SE QUISER – OS CHINESES POVOARÃO O BRASIL”: A PRIMEIRA MISSÃO BRASILEIRA NA CHINA 

“Pois perdemos todo o nosso latim. Bons ou maus, ativos ou malandros, fumadores de ópio ou fabricantes de chá, baratos ou caros, são os chins (denominação de época, usada para se referir aos chineses) que não nos querem nem de longe, disse um diplomata chinês, que não tem papas na língua. De onde se concluiu que quem tinha razão na polêmica eram os que achavam os chins muito bons; tanto que são eles que nos acham maus. E quem tinha intenção de ir à China tem de mudar de rumo” (GAZETA DE NOTÍCIAS, 21 dez. 1879, p.1).

A notícia de que a proposta realizada pela delegação brasileira em Londres, que tinha como fim a contratação de trabalhadores chineses, foi rejeitada pelo marquês Tseng Chi-ce (ministro plenipotenciário da China em Londres), se espalhou em território nacional como rastilho de pólvora. Para muitos contemporâneos, esse episódio colocaria de uma vez por todas um ponto final na calorosa discussão que se fazia época em todas as esferas públicas, sobre a viabilidade ou não de se realizar uma imigração chinesa em massa para o Brasil. No entanto, esse debate estava longe de ter um fim, pois quem tinha a intenção de ir à China não mudou de rumo!

João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu, Presidente do Conselho de ministros e ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas; um dos principais agentes na conversão do tema da mão de obra chinesa em questão nacional (LESSER, 2001, p. 51), depois do inesperado não, ao invés de decretar o fim de todos os projetos do governo Imperial que versavam sobre a contratação de chins, resolveu arriscar, e assim, por meio de uma manobra política, o plano de enviar uma missão Especial Brasileira para a China saiu do papel. Eduardo Callado e Artur Silveira da Mota foram nomeados pelo Imperador os enviados extraordinários e ministros plenipotenciários da missão.

Antes mesmo de a tripulação ser composta, no despacho de 6 de dezembro de 1879, Antônio Moreira de Barros (ministro dos Negócios e Estrangeiros), repassa a Callado e a Mota o projeto do Tratado que deveriam discutir na China, dentre os 10 artigos que compõem o documento, destaca o 8º e 9º que regia sobre a emigração, e manifesta o desejo do Governo Imperial de que fosse feita toda a diligência para aceitação destes dois artigos. Porém, já sabendo das possíveis dificuldades que estes nobres cavalheiros poderiam encontrar, o referido Ministro recomendou que os mesmos buscassem dos governos britânico e americano o apoio diplomático de pudessem necessitar, assim como, realizassem um estudo preliminar, absorvendo todas as informações que lhes fossem úteis para se sobressaírem nessa  negociação.

Tal conselho foi posto em prática; Mota e Callado conseguiram, por exemplo, por meio do marquês Tseng, cartas de recomendações e dados sobre o modo como a missão deveria proceder na negociação do Tratado, ao chegar ao Celeste Império. Sim, esse marquês foi o mesmo que disse NÃO a proposta brasileira para obtenção de trabalhadores chineses. Segundo Dantas (2006, p.128), os líderes dessa missão, muito provavelmente com intuito de obter a adesão total do marquês Tseng, omitiram os artigos a respeito da emigração. Desse modo, para o marquês, a negociação se restringiria as estipulações relativas à amizade, comércio e navegação. Para além das importantes contribuições dadas pelo marquês Tseng, Callado e Mota ressaltam a conquista dos votos de apoio a está missão de B. F. Torreão de Barros, encarregado de negócios interino em Washington, e C. de Freycinet, ministro dos Negócios Estrangeiros da República Francesa, sendo que este último ainda concedeu um intérprete, o senhor Arnold Vissiére.

A bordo da corveta Vital de Oliveira, os encarregados da missão partiram em 14 de março de 1880, do porto de Toulon, e chegaram ao porto de Shanghai, 26 de junho de 1880. Tão logo desembarcaram Eduardo Callado e Artur Silveira da Mota enviaram alguns ofícios ao conselheiro Pedro Luís Pereira de Sousa (ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros do Brasil), o primeiro para informar que haviam chegado a terras chinesas e que pretenderiam seguir viagem para Tianjin em 1 de julho, os outros foram para levar ao conhecimento dessa autoridade alguns fatos, no qual se destaca os embaraços postos pelas autoridades chinesas à emigração para Cuba, e de como a influência inglesa não foi de todo estranha a está resolução.

Em Tianjin, os enviados extraordinários da missão trataram de logo entrar em contato com o vice-rei Li Huang Chang, um dos estadistas de maior prestígio da China, e um dos responsáveis por discutir Tratados com nações estrangeiras. A respeito da primeira entrevista com o vice-rei, Callado e Mota descreveram em ofício enviado em 19 de julho 1880, que Li Huang mostrou-se sobremodo admirado do Brasil contar apenas com 58 anos de existência como nação independente, sendo que a China, disse-o, “com visíveis sinais de orgulho, já era um Estado soberano há quatro mil anos!”. Dentre as outras passagens mencionadas nesse ofício, destacamos duas estratégias usadas pelos representantes do Império brasileiro; a primeira foi de não declarar abertamente que o principal objetivo dessa missão era de facilitar a emigração de chineses para o Brasil, no entanto, de modo a querer suscitar uma boa impressão aos olhos do vice-rei, informaram que no Brasil já havia um crescido número de chins, e ao serem questionados de onde tinham ido para lá, os enviados informaram que, “na maior parte, procediam das colônias chinesas de São Francisco, do Peru, de Demerara e de Cuba, e que para o Brasil haviam ido por sua própria conta” (CHDD, 2012, p. 54).

Notemos que nessa resposta dada, Callado e Mota omitiram a informação de que muitos desses emigrantes que estavam em terras brasileiras eram indivíduos que vieram ainda em 1814, numa tentativa do rei Dom João VI, de cultivar chá (LEITE, 1999, p. 97). As remessas de chineses que vieram por iniciativa de particulares, como o caso do negociante Manoel de Almeida Cardoso em 1855 (ELIAS, 1971, p. 698) também não se fizeram presentes, visto que a intenção era demonstrar que ‘a grande parte’ dos chineses que aqui estavam vieram de outras nações por sua conta própria. O fato de eles afirmarem que esses emigrantes teriam chegado por sua ‘conta própria’, foi muito pertinente, posto que naquela ocasião, tanto no cenário chinês, como mundial, as denúncias sobre as formas de recrutamento dos chineses, assim como os maus-tratos sofridos pelos mesmos em países como Peru e Cuba, estavam gerando repercussões e debates intensos (SILVA, 2016, p. 107). Logo, se havia um interesse por parte dos chineses em ir para o Brasil, era a prova que as formas de trabalho aqui seriam bem melhores do que as vivenciadas por eles em outras nações.

Seguindo com esse jogo de palavras bem pontuadas, Callado e Mota tentavam tecer uma teia de argumentos que pudesse convencer o vice-rei de assinar o Tratado conforme os 10 artigos previamente formulados pelo império brasileiro. Todavia, os trâmites dessa negociação não saíram bem como o planejado, a começar que todos ali pareciam pouco saber sobre o Brasil. Não é à toa, que na segunda entrevista dos enviados extraordinários dessa missão com o vice-rei Li Huan, o mesmo ficou duas horas na casa da legação, na qual a conversação foi exclusivamente a respeito do Brasil. O próprio Eduardo Callado ao observar o que ele classificou como a: “ignorância crassa que se acham os chineses de tudo quanto respeita ao Brasil”, julgou conveniente mandar publicar no jornal de maior circulação de Shanghai, o Shen-Pao, trechos que dessem alguma ideia do nosso país.

Nessa segunda entrevistas, outros percalços surgiram, pois o vice-rei - alegando estar sobrecarregado de afazeres e receando não conseguir participar das inúmeras entrevistas que uma negociação deste porte exigiria - nomeou mandarins de primeira classe, os senhores Ma Kien Tchong e Taotaï de Tien-Tsin para auxiliarem na discussão do acordo. Acrescentou ainda de maneira incisiva que a base dessa discussão partiria de um projeto formulado pelo império chinês.  E quando os enviados do império brasileiro proferiram “que não tinham a pretensão de pedir à China nada mais do que ela havia concedido nos últimos tratados que tem celebrado”, o vice-rei prontamente redarguiu que “os antigos tratados continham cláusulas que originavam graves embaraços ao seu governo e a que este, não obstante, teve de submeter-se por força de circunstâncias”, o que não era o caso agora (CHDD, 2012, p. 57).

Nas demais entrevistas, Callado e Mota teriam que discutir um projeto proposto pelos chineses, no qual a maior parte dos artigos versava a uma convenção puramente comercial. Tal contexto fez com que os enviados dessa missão mudassem suas estratégias, e o que antes era tratado nas entrelinhas, passou a ser proposto na forma de emendas, mais ou menos explícitas. Consequentemente, algumas divergências surgiram.

De um lado os comissários chineses afirmavam que tinham ordens expressas do Tsung-Li Yamên (ministro dos estrangeiros) para não admitirem uma só palavra no tratado a respeito de emigração, e que isso não deveria ser nenhuma surpresa, posto que o império brasileiro já havia sido informado em Londres, de que essa era a disposição do gabinete de Pequim (Beijing). Do outro, Eduardo Callado e Artur Mota replicavam que a insistência nesse assunto fundava-se justamente nos precedentes dessa missão, pois segundo eles:

“a exclusão, no tratado, de qualquer cláusula relativa à emigração, indicava que, nas nossas negociações, haviam prevalecido as prevenções desairosas para o nosso país, que procurou criar uma sociedade particular inglesa (a Anti-slavery Society), na memória dirigida ao marquês Tseng e publicada na imprensa européia; memória em que se nos atribuía o desígnio de querermos perpetuar, com coolies, a escravidão dos negros que tendia a extinguir-se no Brasil” (CHDD, 2012, p. 70).

Acrescentaram que viam com pesar que o gabinete de Beijing tivesse se deixado impressionar com aquela que classificaram como “torpe denúncia”, e a partir de então, abundaram em considerações no sentido de demonstrar que a acusação realizada pela Anti-slavery Society não tinha fundamentos.  Começaram colocando em relevo os generosos intuitos da lei do ventre livre. E com a intenção clara de evidenciar as ações que faziam o governo para assegurar o bem estar dos imigrantes que procuravam o solo brasileiro, expuseram algumas notícias do Jornal do Commercio que descreviam a excelente recepção que os imigrantes recebiam ao chegar à Capital do Rio de Janeiro, destacaram inclusive uma que mencionava a chegada de 40 chins. Quanto à alegação de que os chins seriam tratados como ‘escravos amarelos’, Callado e Mota retorquiram, afirmando que a partir do momento em “que a China tivesse um agente diplomático e agentes consulares no Brasil, não devia recear de que os seus súditos ali fossem tratados de modo diferente do que o são os súditos de todas as outras nações”, e prosseguem dizendo:

“que para os dois países era uma experiência a fazer-se e que, se esta não provasse bem para os chins, o governo chinês podia sempre obrar como tem obrado em relação à emigração para o Peru e para Cuba, que de fato cessou há alguns anos, não obstante achar-se regulamentada em convenções especiais”.

Cabe ressaltar como os argumentos e as considerações utilizadas por Callado e Mota nessa discussão, divergem daquelas apresentadas e debatidas no cenário nacional. Se durante toda a negociação da missão os enviados extraordinários colocaram os chins em caráter de emigrantes, e até em pé de igualdade com os outros súditos das outras nações. Nos debates travados em território brasileiro essa igualdade não só não existia como os trabalhadores chineses jamais foram visto como ‘imigrantes’, tanto que era consenso que o chinês seria apenas uma machina de trabalho, e não um imigrante com direitos a se radicar e criar raízes (DEZEM, 2005, p. 101). Esse posicionamento pode ser verificado de maneira explícita nas palavras do próprio Sinimbu ainda no Congresso Agrícola (1878), quando afirmou que a mão de obra chinesa seria apenas um “instrumento transitório da nossa riqueza, ela operará entre nós a substituição do trabalho servil pelo trabalho livre, desbravará o terreno e abrirá os caminhos por onde a emigração da Europa correrá mais tarde a disputar a posse do solo de nossa Pátria” (CONGRESSO AGRÍCOLA, 1988, p.125).

Deste modo, esse deixar entender que os chins viriam para o Brasil em condição de imigrantes, era mais um artifício de oratória empregado por Callado e Mota, e já que a palavra emigração era expressamente proibida nesse tratado, viram uma brecha, e propuseram a seguinte emenda no artigo 1º:

“Haverá paz perpétua e amizade constante entre S. M. o Imperador do Brasil e S. M. o Imperador da China, seus herdeiros e sucessores, bem como entre seus respectivos súditos. Estes poderão, d’ora em diante, ir livremente de um para o outro país das altas partes contratantes, quer para fins de comércio ou de trabalho, quer como residentes permanentes, ou como simples viajantes; obterão, nos estados respectivos das altas partes contratantes, uma plena e inteira proteção para suas pessoas, suas famílias e suas propriedades, e gozarão de todos os direitos, vantagens e franquezas que houverem sido ou vierem a ser concedidas aos súditos da nação mais favorecida”.

Depois de muito relutarem, e de algumas concessões, os enviados extraordinários conseguiram manter uma cláusula no Tratado que estabelecia a faculdade dos súditos chineses de irem livremente para o Brasil. E por conta de alguns acontecimentos políticos que estavam acontecendo na China e receosos de perder o que já haviam alcançado, Callado e Mota, mesmo admitindo algumas lacunas e principalmente defeitos de forma no Tratado, assinaram-no em 5 de setembro de 1880.

Com vista do tratado assinado, Arthur Mota recebe ordem do Governo Imperial de retirar-se para o Brasil. Eduardo Callado permanece na China até outubro de 1882. Nesse ínterim, Callado ficou responsável por pleitear junto ao governo da China as alterações requeridas pelo governo brasileiro, o que levou a formulação de um novo Tratado, que foi assinado em 3 de outubro de 1881. Concomitantemente com essa atribuição oficial foi designado que Eduardo Callado colhesse informações e produzisse um plano que facilitasse ao Brasil a aquisição de mão de obra chinesa. O mesmo fez um detalhado estudo, no qual concluiu que a melhor opção seria contratar os serviços de uma companhia chinesa, a China Merchants’ Steam Navigation, pois a mesma possuía trinta vapores de primeira classe, com amplas acomodações e estava pronta para negociar o estabelecimento de uma linha regular de vapores de três a quatro mil toneladas, capazes de conduzir de 1.000 a 1.200 passageiros, propondo fazer seis viagens redondas por ano, entre a China e o Brasil.

O estudo feito por Callado foi tão bem aceito pelo governo que no mês de outubro do ano de 1883, um dos dirigentes da Companhia, o senhor Tong Kingsing, veio até ao Brasil para conversar diretamente com o Imperado D. Pedro II sobre a instauração dessa linha de vapores. O alvoroço causado pela chegada desse dirigente foi tão grande quanto à certeza de que a emigração de chineses estava a alguns passos de acontecer, tanto que em um ensaio crítico publicado pelo Jornal do Commercio em 18 de outubro de 1883, na primeira frase constava: “Faça-se o que se quiser – os chineses povoarão o Brasil”.

Considerações Finais
O sucesso dessa empreitada aparentemente garantira que o Brasil receberia braços chineses, mas não foi o que ocorreu. Um amplo movimento intelectual, social e político se mobilizaria, na mesma época, pressionando gradativamente o governo em relação a essa questão. Devido ao espaço limitado desse texto, resta-nos deixar uma abertura: por que a imigração chinesa não aconteceu em grandes proporções nesse período no Brasil? É o que analisaremos em outros momentos, ao longo do desenvolvimento de nossas pesquisas de doutorado.

Referência:
Kamila Czepula é doutoranda do programa de pós-graduação em História da UFRRJ.
E-mail: kamiczepula@gmail.com

Fontes:
CONGRESSO AGRÍCOLA. Edição fac-similar dos Anais do Congresso Agrícola realizado no Rio de Janeiro em 1878. Rio de Janeiro: Fundação Casa Rui Barbosa, 1988.
Documentação Diplomática da Missão à China (1879-1882). Cadernos do CHDD, nº 20. Rio de janeiro: Centro de História e Documentação Diplomática, 2012.
Gazeta de Notícias. Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 1879. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Crônicas, reportagens, e colaborações diversas.
Jornal do Commercio. Rio de Janeiro, 18 de outubro de 1883. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Crônicas, reportagens, e colaborações diversas

Bibliografia:
DANTAS, Fábio Lafaiete. Origem das relações entre o Brasil e a China: a missão especial de 1879. Recife: Liber, 2006.
DEZEM, R. Matizes do “amarelo”: a gênese dos discursos sobre os orientais no Brasil(1878-1908). São Paulo: Associação Editorial Humanitas, 2005.
ELIAS, José Maria. Os Debates sobre o trabalho dos chins e o problema da mão de obra no Brasil durante o século XIX. In: Anais do VI Simposio Nacional dos Professores dos Professores de História. Goiania:ANPUH, setembro de 1971.
LEITE, José Roberto Teixeira. A China no Brasil: influências, marcas, ecos e sobrevivências chinesas na sociedade e na arte brasileiras. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1999.
LESSER, J.  A negociação da identidade nacional: minorias e a luta pela etnicidade no Brasil. Editora Unesp, SP, 2001.
SILVA, João Ítalo de Oliveira e.  A experiência Coolie na América Latina (Cuba, Peru e México) eas possibilidades de uma história transnacional. Temporalidades – Revista de História. Belo Horizonte, 2016, V. 8. N. 2.

11 comentários:

  1. Oi Kamila, eu me chamo Nadiá Cassandra Telles.
    Queria saber se vc entende que os chineses representam até hoje um perigo pra o Brasil? Tipo, eles tão em tudo que é mercado, vendendo comprando, vc não acha que os pensadores brasileiros podiam estar certo?
    @brigada!
    assina: Nadiá Cassandra Telles

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    1. Olá, Nadiá!

      Os contextos históricos são bem distintos. Muitos intelectuais e políticos brasileiros do século 19 viam os chineses como um perigo, por entenderem que os mesmos degradariam a nossa raça, trariam os piores vícios e doenças, e difundiriam a descrença pela fé católica, dentre outros pejorativos que detinham uma carga elevada de preconceito e racismo. Se temos como princípio uma sociedade multicultural, na qual prezamos para que a igualdade, o respeito e o intercâmbio de saberes prevaleçam, logo, se transportarmos (anacronicamente) os argumentos utilizados por esses personagens para os dias de hoje eles se tornam ainda mais inaceitáveis.
      Grata pela pergunta!

      Um abraço,
      Kamila Czepula.

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  2. Cara Kamila:
    Parabéns pelo seu texto. Sou graduando em História de Pernambuco, e estudo as relações de trabalho no Brasil Império. Você poderia explicar, sucintamente, as razões dos chineses não terem vindo para o Brasil? Esse contrato de trabalho dos chineses, seria um tipo de servidão temporária? Que bibliografia você pode indicar?
    Obrigado,
    Miguel Arconada Silva

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    1. Olá, Miguel!
      Muitíssimo obrigada!

      Entre as razões mais defendidas, figuram: o racismo, a questão biológica, a falta de interesse por parte dos grandes plantadores, e a conjuntura internacional anti-coolie trade. Todavia, na minha pesquisa tento demonstrar que por meio do uso de elaboradas estratégias retóricas, alicerçadas por um amplo conjunto de fontes diversas e ações diretas, os intelectuais da “geração de 1870‟ (Joaquim Nabuco, Miguel Lemos, José do Patrocínio) conseguiram impedir a efetivação de projetos de imigração chinesa em massa para o Brasil.
      A respeito dos contratos há ainda uma discussão muito grande em torno deles, em inglês, por exemplo, a expressão utilizada é indentured labor, que indica total sujeição do trabalhador ao contrato por um determinado tempo, desde sua partida, em que lhe foi paga a passagem; a exígua remuneração e a responsabilidade do patrão em fornecer alimentação e alojamento, intensificam ainda mais a dependência, sendo comum associar o tratamento recebido ao de um escravo. Blackburn emprega o termo “trabalho sob contrato de servidão”. Já Rebecca J. Scott prefere o termo “trabalho sob contrato” distinguido de servidão.
      As referências principais são:
      Conrad, Robert (1975). “The Planter Class and the Debate over Chinese Immigrant to Brazil, 1850-1893”. International Migration Review, v.9.

      CZEPULA, Kamila. Os indesejáveis “CHINS”: um debate sobre a imigração chinesa no Brasil Império (1878-1879). Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Assis, 2017
      Dezem, Rogério (2005). Matizes do “amarelo”: a gênese dos discursos sobre os orientais no Brasil (1878-1908). São Paulo: Associação Editorial Humanitas.

      Elias, José Maria (1971). Os Debates sobre o trabalho dos chins e o problema da mão de obra no Brasil durante o século XIX. In: Anais do VI Simposio Nacional dos Professores dos Professores de História. Goiania:ANPUH, setembro.

      Hui, Juan Hung (1992). Chinos en América. Bilbao: Editorial Mapfre.

      Leite, José Roberto Teixeira (1999). A China no Brasil: influências, marcas, ecos e sobrevivências chinesas na sociedade e na arte brasileiras. Campinas, SP: Editora da Unicamp.

      Lesser, J (2001). A negociação da identidade nacional: minorias e a luta pela etnicidade no Brasil. Editora Unesp, SP.

      Lima, Silvio Cezar de Souza (2005). Determinismo biológico e imigração chinesa em Nicolau Moreira (1870-1890). Rio de Janeiro: Dissertação, FIOCRUZ.

      Peres, Victor Hugo Luna (2013). Os “Chins” nas Sociedades Tropicais de Plantação. Dissertação (História), UFPE, Recife.


      Um abraço,
      Kamila.

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  3. Houve outras missões a China na época do império?
    obrigada
    Marina Sampaio

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  4. Olá, Marina!

    Houve sim, em 1893 -1894 o Barão de Ladário, José de Costa Azevedo, foi enviado a Beijing para negociar um novo tratado de comércio e imigração com o imperador chinês.

    Grata pela pergunta! =]
    Um abraço,
    Kamila.

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  5. Oi Kamila,
    parabéns pelo texto.
    Confesso que não imaginava que pudesse ter ocorrido o interesse por mão de obra "não branca" nesse período do Império.
    Obras como a de Varnhagen que via na mestiçagem um empobrecimento e a política de "embranquecer" a população brasileira é o que povoa minha mente ao se pensar o período.
    Já perguntaram acima sobre os motivos que inviabilizaram, por assim dizer, a vinda dos chineses; porém quero continuar nesse aspecto.
    Você cita, em algum momento, o fato de uma exígua remuneração que esses trabalhadores receberiam.
    Eu vejo um certo 'confronto" entre a questão econômica e a questão racial.
    A questão racial foi suficiente para que esta mão de obra fosse utilizada no Brasil?
    A política de uma suposta pureza racial venceu o fator econômico nesta questão?

    Agradeço o retorno,

    Fábio Henrique Silva dos Santos.
    e-mail utilizado para o Simpósio: fabhssantos@yahoo.com.br

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    1. Olá, Fábio!

      Grata pelo elogio e pela pergunta!

      Não há dúvidas que a questão racial teve um papel importantíssimo nesse debate. No entanto, ela por si só não seria capaz de vencer o fator econômico. O que de fato, foi determinante para que essa imigração não acontecesse, é o que buscamos demonstrar na nossa pesquisa, foram às ações e estratégicas retóricas muito bem empregadas por alguns intelectuais da época. Para se ter uma ideia, esses intelectuais colocavam em cheque, até mesmo o fator econômico, alegando que em razão da distância entre Brasil e China serem maiores, o preço pelo trabalho do ‘chim’ seria elevado, a um ponto que não compensaria aos lavradores realizar essa contratação.
      Espero ter conseguido responder a sua pergunta, e se restar qualquer dúvida, por gentileza, entre em contato novamente.

      Saudações,
      Kamila Czepula.

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  6. Boa noite Kamila, parabéns pelo texto e pelo tema de pesquisa.

    No início do texto, você menciona os projetos do governo Imperial que foram encerrados. Poderia dar-me alguns exemplos desses projetos e quais eram os objetivos?
    Obrigada.
    Daniele Prozczinski

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    1. Olá, Daniele!
      Grata pelo comentário! =D

      Os projetos tinham sempre como objetivo principal a contratação de mão de obra chinesa. O primeiro projeto (1870- 1875) vislumbrava a importação desses trabalhadores a partir de Hong Kong (com os ingleses) e/ou Macau (com os portugueses) por meio da Sociedade Importadora de Trabalhadores Asiáticos - dirigida por Manoel José da Costa Lima e João Antônio de Miranda e Silva. Depois de inúmeros obstáculos, viram que o único caminho para viabilizar a contratação dessa mão de obra seria através de um Tratado de comércio e imigração direto com o governo chinês, que se iniciou em 1879. Concomitantemente com esse projeto, o governo cogitava outro: a inserção da “cultura do chá e do bicho da seda”.
      Um abraço,
      Kamila Czepula.

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  7. Kamila Czepula,
    E as barreiras linguísticas??

    Tudo bem que iriam utilizar estes chineses como mão-de-obra definitiva, e que não há uma necessidade maior para o "uso idiomático" abrangente.
    No entanto, as diferenças entre a língua portuguesa e a chinesa são exorbitantes.

    Sei que as línguas de matriz africana também são bem diferenciadas.

    Mas o ponto também é: Houve alguma observação ou artigo encontrado em alguma documentação desses tratados que incluíam a atribuição da língua portuguesa como critério para esta emigração?

    Houve iniciativa do governo na propagação da língua portuguesa para estes emigrantes chineses, em especifíco?

    Ass: Gisely Capitulino da Fonseca.

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